O Menu na Janela
Segunda: abobrinha ao forno.
Ela chegou dizendo ter ouvido que eu estava de caso com a moça que trabalha de caixa na farmácia. Tudo bem que a moçoila em questão é mesmo uma gracinha. Tipo mignon, peitos empinadésimos, pernas grossas, uma voz muito sensual para quem pergunta para o balconista se já chegou o remédio para urticária. Devo mesmo ter reparado nela. Agora, daí a dizer que estamos tendo um caso, vai uma grande distância. Caso é uma palavra muito forte. A não ser que agora já se chama “caso” ficar de vez em quando conversando na saída do trabalho. O máximo que fizemos foi passear de carro algumas vezes até as proximidades do parque da cidade, mas eu tenho certeza que isso ninguém viu.
Terça: pato no tucupi.
Parece que o filho da vizinha da farmácia, um adolescente cheio de espinhas na cara que trabalha na lanchonete da esquina, apelidado de “Choquito”, me viu apanhando a Dyane (esse era nome dela, parece que uma homenagem a um romance barato que a mãe era vidrada, se é que prestei atenção na história) umas sete ou oito vezes. Diz ela que o rapaz inclusive andou fotografando a cena. Ah, se eu pego esse “Choquito”... Não tem mais o que fazer? Vou espremer toda aquela cara caramelizada com flocos crocantes do mais puro chocolate...
Quarta: rabada.
Fui à forra. Parece que a história toda da tal fotografia era invenção. Limpei minha barra. Agora ela tinha que ouvir! Que negócio era esse de acreditar em tudo o que se fala? Ainda mais sobre a minha pessoa, um cara trabalhador, que só tem olhos para a sua mulher (que culpa eu tenho se em boa parte do dia a minha mulher não está na frente dos meus olhos?). Se era para me condenar, pelo menos escolhesse alguém da minha altura, não essa moça de um metro e cinqüenta e qua...(ops!). Essa baixinha de meia-tigela! Além do mais, que culpa eu tinha de a minha velha enxaqueca ter piorado nos últimos meses? O que? Eu nunca tive dor de cabeça? Quem falou em dor de cabeça? Eu falei enxaqueca! Olha, era melhor mesmo deixar isso para lá. Eu não queria mais ouvir falar em Dya...(ops de novo!) dyabo de mulher nenhuma nessa casa de novo!
Obrigado, meu Deus!
Quinta: buchada.
Como é que era? Agora o bairro inteiro andava dizendo que a moça estava grávida? Era só o que me faltava! Só faltava dizer que o Diamante Negro (era Choquito, Choquito, claro) andava me ameaçando com o DNA da criança! Quantas vezes ia ter que repetir que eu mal a conhecia? O que, ela andava por aí dizendo que eu era o pai do bebê? Ai, minha dor de estômago voltando... Hein, não era dor de cabeça? Chega, não quero mais papo!
Sexta: ensopado.
Tocaram a campainha. A empregada anunciou. Tinha uma tal de Dayane ou Diane querendo falar com a patroa. Não podia ser verdade. Por que ninguém nos ensina como reagir numa hora dessas? Simularia um infarto? Correria para o quarto para fazer as malas e pularia a janela? Do vigésimo quinto andar as chances de escapar seriam pequenas. Não adiantaria. Devia encarar os fatos. Quem sabe não ocorreria algum milagre? Talvez tivesse esquecido o troco do remédio para a pressão.
Sábado: picadinho.
A cena habitual. Ia sair de casa. Ela nunca esperava que isso fosse acontecer um dia. Logo eu, um sujeito tão trabalhador, que dizia só ter olhos para ela... Desisti da janela. Mas do jeito que as coisas andavam, estava considerando seriamente as alternativas. Diziam que monóxido de carbono era indolor, mas a garagem do prédio era toda monitorada. Além do mais, a minha asma já não estava grande coisa mesmo...
Domingo: pizza (encomendada)
Prometi que nunca mais poria os pés naquela maldita farmácia. Não sei se ela acreditou ou estava só querendo dar um tempo, planejando uma morte mais lenta. O fato é que eu realmente não cheguei mais perto da Dyana. Ainda mais que o filhote é a cara do dono da farmácia. Mas tenho achado que agora estamos indo muito bem. Exceto pelas minhas crises renais e por aquela gostosinha da imobiliária, que não pára de me dar bola.